Bia Nascimento e João Cordeiro lançam "Água de Nascente"
Singeleza e calmaria são algumas das principais marcas
sonoras do álbum “Água de Nascente”, do duo Nascente. O violão de Bia
Nascimento e o vibrafone de João Cordeiro têm uma potência capaz de preencher
os vazios sonoros - ou da alma - de ouvidos mais atentos e sensíveis, numa
fluidez rítmica propícia ao deleite.
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Foto: Marina Costa |
O desafio de escrever arranjos que soam completos,
com apenas dois instrumentos musicais, contou com o trabalho do arranjador
Caetano Brasil, que, de acordo com a dupla, é a pessoa ideal para unir
vibrafone e violão, “de forma uniforme e horizontal”.
“Ele tem a sensibilidade para fazê-lo, de modo que cada um
ocupe a sua cena, costurando entre as melodias e os ritmos, compartilhando o
espaço da música” – ressalta Bia.
Democracia
musical
O trabalho do duo Nascente abraça o conceito de
pensar a música instrumental para além das salas de concerto, no sentido de fazer
com que esse estilo chegue a ouvidos mais jovens, desacostumados com a música
que Bia e João executam. A violonista
avalia que os desafios para a empreitada são muitos e, principalmente,
políticos. Isso porque, para ela, a “música instrumental é classista”, feita e
consumida para uma classe social específica:
“É algo construído socialmente, há muitos anos. O desafio está
posto, desde 1500. A nossa sorte é que a música brasileira rompe muitas
barreiras musicais, políticas e sociais. O choro, o xote e o ijexá, por
exemplo, estão presentes no nosso EP, o que democratiza mais a música
instrumental. Ainda assim, tenho total consciência de que a música que fazemos
não vai atingir um público tik tok, por exemplo. E está tudo bem”.
A musicista percebe que a mudança está em ampliar o
acesso aos shows e dar importância a leis de incentivo que possibilitem ao
músico ocupar lugares não privados. “É muita estrada a percorrer, ainda mais
atualmente, em que tudo é líquido. A gente está correndo contra a maré” –
explica Bia.
Minas
Bia e João são partes da pujante cena da música
instrumental de Minas e Juiz de Fora, que muito contribuiu - com Milton
Nascimento, Lô Borges, Fernando Brant e o Clube da Esquina - para a música
popular brasileira e suas ramificações instrumentais. O vibracionista se sente
privilegiado por ter nascido num estado de “tantas inspirações ao redor”. “Posso
dizer o que mais me encanta na música mineira, que são as harmonias” – inspira-se.
A violonista acrescenta que, nos últimos anos, “o
único orgulho que não tenho perdido do Brasil é da nossa música”. Para ela,
musicalmente, Minas “trouxe a calmaria”:
“Quando eu escuto esses caras, sinto vento no peito. É uma
música que abre espaço. É como se sentíssemos cada esquina de Minas mesmo,
tomando um café. E aí, como sou violonista, ligo essa sensação com os acordes
soltos do Milton, de corda solta. Uns acordes abertos, que é tipo quando a
gente está em cima de uma montanha, vendo tudo em 360 graus. Isso tudo sempre
me influenciou muito, principalmente porque também cresci ouvindo. Quando
componho, por exemplo, essas sensações vêm de forma muito natural".