Apuro musical e
riquezas melódicas são destaque em novo EP
Imagem: divulgação |
Durante um certo tempo de sua vida, o cantor e compositor baiano –
radicado em São Paulo desde os 22 anos -, Matheus Marê, dividia o seu talento
artístico com o antigo trabalho no setor de autopeças. Esta era uma das
atividades que ele e muitos outros talentos desconhecidos Brasil afora faziam
(ou ainda fazem), antes de trabalhar, hoje, integralmente com música.
Sua dedicação à arte se reflete na sonoridade de ‘Viajante’. O novo EP
de Marê possui uma forte pegada da Música Popular Brasileira tradicional –
incluindo a pré-MPB, a bossa nova e o samba. Mas ele gosta, também, de viajar
entre diferentes modos de se fazer música, retirando dela algo de fresco e novo.
‘Clouds in the Sky’, por exemplo, é um rock que lembra ao ouvinte que nomes
como Cazuza não morreram; já ‘Um Pouco De Soul’ bebe do suco desse estilo
musical norte-americano:
“A minha identidade musical passa pela poesia e a sensibilidade, numa
constante construção de beleza com as palavras”.
Trajetória
Até chegar ao ponto de viver exclusivamente da música, Matheus contou
com outros artistas, que lhe abriram portas. Nesse universo, ele é grato a
muita gente, principalmente pessoas que lhe ensinaram algo, apoiaram-no e lhe
emprestaram conhecimento e arte.
Foto: divulgação |
Para o baiano, essas pessoas e instituições - como a Escola de Música
& Tecnologia, onde se formou, em São Paulo, como técnico de áudio – fizeram,
de diferentes formas, parte do seu crescimento:
“Lá, há profissionais do meio da produção e músicos fantásticos. Sou
grato ao sanfoneiro, produtor e diretor artístico Bolinha, que abriu todo o leque para a gente trabalhar com as minhas
composições, neste que é um EP totalmente artístico. Foi tudo muito bem feito”.
Foi através de Bolinha - ganhador de um Grammy Latino -, aliás, que Marê conheceu artistas e
profissionais de renome, como o baterista Carlos Bala e o técnico de áudio Luís
Paulo Serafim – de quem o cantor admira o trabalho. “É o maior e mais lendário técnico
de áudio do Brasil. É sempre muito bom vê-lo trabalhando, mixando, captando e,
agora, fazer parte disso. Seu lema é ‘mixar com arte’. É exatamente o que ele faz”
– elogia Matheus.
Baterista Carlos Bala. Foto: Facebook |
Qualidade
Quem escuta o EP ‘Viajante’ percebe o cuidado e a acurácia técnica dos
arranjos, que contaram com o apoio do maestro J Resende, “um músico genial”,
que não alterou nada da melodia da voz composta por Matheus.
Todas as composições de Marê nascem do violão e de uma folha de papel. Num
constante fluxo de ideias, ele trabalha a partir de uma música e, dela, vem a
harmonia, a melodia da voz e as palavras, “como uma coisa só”:
“Estou apaixonado por esses arranjos do maestro J Resende. Ele ampliou
as harmonias que eu havia feito inicialmente ao violão, adaptando tudo para a
banda de uma forma perfeita, que realmente me emociona”.
Mercado
Nas palavras do cantor Matheus Marê, a geração atual não tem mais tempo
para mastigar algo: “tem que receber tudo engolindo”. Ainda de acordo com o
músico, em aplicativos como o Tik Tok, por exemplo, o espectador fica atento
àqueles 15 segundos “que te prendem e que têm de ser chiclete”:
“Se você colocar uma música de Caetano Veloso, Djavan ou a minha mesmo,
nos stories ou no Tik Tok, não haverá
o mesmo impacto que uma, feita exclusivamente para ser consumida naqueles meios
de comunicação”.
Apesar de acreditar que as novas gerações estão com a atenção voltada a
um conteúdo “quase irracional”, que prejudica a difusão de músicas que procuram
ser um pouco mais ricas, cultural e artisticamente, o artista ressalta que, na
MPB, o Brasil vivencia um processo de retomada.
Para Matheus, o mainstream
está repleto de artistas que fogem desse estilo musical e vão mais para o
caminho do sertanejo, do funk e do pop. Mesmo assim, ele acredita na força da
Música Popular Brasileira. “Há muitos artistas crescendo e conseguindo expandir
para demais camadas de ouvintes, na nossa sociedade. A perspectiva é boa e eu,
humildemente, tento fazer parte de todo esse contexto” – ressalta o cantor, que
acredita que a MPB deveria merecer mais destaque na mídia.
Marê ressalta que não faz sentido “uma música tão rica, harmonicamente,
que culturalmente abrange diversos assuntos de raiz nacional”, não ter o
destaque que merece. Ele defende a tese de que, geralmente, os espaços de mídia
estão reservados a coisas mais acessíveis, “simplistas mesmo”:
“Certamente, não falta riqueza na música brasileira. Nossa musicalidade
está presente hoje, tanto quanto o fora em outros tempos, em que a MPB tinha mais
espaço na mídia. O que acontece é um afunilamento”.
O cantor observa ainda que existe um nicho para a MPB e há possibilidades para se “furar a bolha”. Ele analisa que a própria Internet oferece plataformas e possibilidades de resistência, apesar dela ser a responsável pelo crescimento de conteúdos cada vez mais rápidos e menos filtrados. “Artistas independentes, como eu, e milhares de outros, Brasil afora, têm a possibilidade de criar e difundir conteúdo. A Internet pode, também, ser uma ferramenta de resgate da cultura brasileira para as massas. Tudo é cíclico” – reflete o músico.
Apresentações
Durante o período em que esteve produzindo o ‘Viajante’, Matheus Marê
estava se preparando para pegar a estrada. Atualmente, ele vem ensaiando um
repertório autoral, mesclado a clássicos do cancioneiro popular. Nos shows, na
banda que Marê vem ensaiando e o acompanha, há nomes como Victor Cabral, na
bateria; Igor Pimenta, no baixo; Tom Santana, na guitarra; e André Freitas, no
teclado. “São músicos maravilhosos, do nível desses que gravaram o EP” – elogia
Matheus, que já tem um show agendado para 26 de agosto, no Teatro Pedro Ivo, em
Florianópolis (SC):
“O ‘Tributos’ homenageia o baiano Dorival Caymmi, o paulista Adoniran Barbosa e o carioca Cartola, três dos maiores nomes do nosso samba. O show foca totalmente na música deles. Estamos preparando esse evento com um carinho muito especial”.
Além do próprio Matheus, de Carlos Bala, Luís Paulo Serafim e J Resende, o EP ‘Viajante’ contou com o baixo de Alex Mesquita; o violão e a guitarra de Conrado Góis; a percussão de Alexandre de Jesus; e, em algumas faixas, com um naipe de metais, como o do sax alto de Cássio Ferreira. “É muita gente boa! Esse EP não contou apenas com um artista: são vários! Cada um colocou sua musicalidade ali, para chegar a esse resultado!” – comemora o músico.
Ouça 'Viajante' aqui.
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