Cosmopolita. Assim pode-se definir a sonoridade da banda carioca Dedos em Som. Aglutinadores, o quinteto formado por Marcelo Cucco (saxofones), Tomas Gonzaga (piano/teclado), Martina Carvalho (percussão), Hugo Noguchi (baixo) e Gabriel Barbosa (bateria) lançou seu primeiro álbum - Dedos em som: corrupção, valores e vaidades - em 2015, com músicas como Bahia Veneno, Escola do Capão e De Repente. Mesclando cúmbia, samba, jazz, outros ritmos locais e universais, improvisando, de maneira particularíssima, uma sonoridade que pode ser facilmente apreciada por um público sedento por novidades, aqui e lá fora. Um dos instrumentistas da banda, Marcelo Cucco concedeu esta entrevista à Cena da Música Independente - CMIND. Confira!
CMIND: Cucco, você é estudante de música da UniRio.
Como vê a cena da música instrumental brasileira? Há espaço para todo mundo?
Marcelo Cucco: Estudo licenciatura para me formar
como professor de música. Como estudante de professorado em música e músico
ativo no cenário do Rio de Janeiro e outros estados, vejo um interesse grande
da nova geração em explorar sonoridades instrumentais e, pela pouca
oportunidade de apresentação com boa remuneração nas casas de show, vejo que
muitos amigos têm procurado tocar bastante na rua. Acredito que as
apresentações na rua, somadas ao fácil acesso às músicas de várias gerações na
internet, têm sido fundamentais para desencadear este tipo de interesse por
novas sonoridades. A música instrumental, que é a base de todas as canções,
ganha força e liberdade neste contexto contemporâneo.
CMIND: Como e
quando surgiu a ideia de formar a Dedos em Som?
Marcelo
Cucco: Dedos em
Som surgiu quando decidi trancar alguns períodos na faculdade para conhecer na
prática os valores culturais do Brasil em suas cinco regiões. O Gabriel
Carneiro, baterista e um dos compositores do primeiro álbum, foi junto, com o
mesmo propósito. Nos deparamos com uma diversidade incrível - natural
cultural... E isso foi um baita de um convite para chegar tocando e me
envolvendo com o povo e a musicalidade de cada lugar. Muito inspirado e
encantado com a percepção aberta a respeito do mundo como um todo, saíram
várias composições e a musicalidade transbordou. Quando voltamos para o Rio de
Janeiro, a ideia era apenas gravar um álbum, chamado "Dedos em Som:
Corrupção, valores e vaidades"; mas, como aquela musicalidade estava tão
contagiante, nós, músicos, pegamos a estrada e apresentamos, juntos, o som em
várias cidades do Rio, Minas e Goiás. Assim, resolvemos virar uma banda mantendo
a essência das vivências práticas e inspiração na multiculturalidade do mundo.
CMIND: Onde foram
as primeiras turnês e como foi a receptividade do público?
Marcelo
Cucco: A primeira
turnê deu início assim que acabamos de gravar o primeiro álbum. Tocamos em Belo
Horizonte, Diamantina, Milho Verde, Ouro Preto, Brasília e mais um monte de
cidades que víamos na estrada, simplesmente pela curiosidade de conhecer os
moradores e a reação do público com o nosso som. A reação que as pessoas
têm, por incrível que pareça, é a mesma que temos quando estamos tocando. Elas
dançam, se deixam levar, se surpreendem a cada instante. Ficam viajando em seus
interiores, sentem a textura e a emoção de cada composição. Eu, pessoalmente,
ao tocar com os Dedos em Som, me sinto contemplando a vida com seus mistérios e
me permito ser levado, intuitivamente, como se estivéssemos sendo auxiliados
por forças divinas emitindo cura para a alma e em conexão com a natureza.
CMIND: Atualmente,
com a multiplicidade de pessoas produzindo conteúdo cultural, em tempo real - e
por todos os lados -, as plataformas digitais vêm de fato colaborando na
divulgação do trabalho de vocês? Como vencer a barreira da invisibilidade?
Marcelo
Cucco: Essa é a
grande novidade da nossa geração. Nas nossas redes sociais, compartilhamos
desde as vivências multiculturais na estrada, lançamento de novos trabalhos e
shows. O mercado nunca esteve tão condicionado à economia e ao empreendedorismo
quanto hoje, e isso por um lado torna a relação profissional mais fluida e
natural. Por exemplo, amigos meus do Equador, Argentina e pessoas de outros
continentes que assistiram um show nosso podem continuar nos acompanhando
apenas pelo Facebook. Posso dizer que as plataformas digitais, a princípio, vêm
ajudando o projeto a manter a sua essência espontânea, livre e em contato com
pessoas de diversas localidades. Essas características têm uma importância
fundamental no desenvolvimento estético na música dos Dedos em Som.
CMIND: No Brasil,
ao tocar nas ruas de nossas cidades, vocês se deparam com muita repressão por
parte do poder público?
Marcelo
Cucco: Olha, na
maioria das cidades não. Pelo contrário: as pessoas e as autoridades policiais
se encantam. No Brasil, por exemplo, vale lembrar que existem poucas cidades
grandes. Acho que esses conflitos se dão mais por conta de violência urbana.
Pessoas que se estressam facilmente com qualquer coisa, que já desistiram de
sobreviver em harmonia com as diferenças. É claro que precisamos respeitar
locais onde seja exigido silêncio ou um fluxo livre. A intenção de tocar na rua
nunca é de causar desordem e conflitos, mas proporcionar interatividade a
aglomerar públicos voluntários para um entretenimento cultural. Na maioria das
cidades pelas quais passei no Brasil e em outros países a receptividade foi
ótima. As mídias e jornalistas locais, que geralmente recebem notificação da
população para que não deixem de registrar novas expressões artísticas de graça,
na rua, são acessíveis a todos. Além de ser um prazer, as pessoas se interessam
mais em comprar CD ouvindo a banda tocando na rua do que na Internet. É muito
carinho e afeto - levar alegria para a rua é uma satisfação incomparável!
CMIND: O que tem a
dizer para as novas gerações de músicos brasileiros que pretendem se
profissionalizar como artistas, num ambiente tão difícil, de muita luta por
espaço e sobrevivência?
Marcelo
Cucco: Ninguém
nunca me disse "seja músico". Eu segui os primeiros anos da vida e
algo mais forte do que minha consciência foi me levando para esse caminho da
arte. As artes me fizeram ver que as pessoas são diferentes e que a diferença
entre elas pode virar uma grande obra de arte. Quase depois de 10 anos como
músico profissional resolvi fazer faculdade de música. Lá, aprendo muito e
ganho bases para me inserir em diversas áreas do mercado. Ou seja, independendo
das escolhas, sempre temos muito o que aprender e assim nos fortalecer no
caminho.
O trabalho
de Dedos em Som pode ser encontrado em http://www.dedosemsom.com/ e também no Facebook, Twitter, YouTube
e no SoundCloud.
Texto: Saulo Andrade, jornalista.
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